A Constituição da República Portuguesa impõe que todos os crimes sejam investigados. Significa isto que o Ministério Público não pode escolher o que quer investigar ou, sequer, quando quer investigar.
É o chamado princípio da legalidade, numa das suas vertentes. Não obstante e ainda assim, o legislador entendeu aprovar uma lei destinada a criar prioridades na investigação criminal (no caso do biénio 2017-2019 através da Lei n.º 96/2017, de 23 de agosto). Ou seja, como que contrariando aquele princípio, o poder legislativo veio dizer que crimes queria ver investigados antes dos demais.
Como aos tribunais cabe aplicar a lei (até que, eventualmente, seja declarada a sua inconstitucionalidade), o MP terá de, no biénio 17-19, investigar prioritariamente os crimes de terrorismo, violência doméstica, sexuais, tráfico de pessoas, contra a vida e a integridade física praticados contra agentes de autoridade, furto e roubo em residências, cibercriminalidade, criminalidade violenta em ambiente escolar, extorsão, corrupção e criminalidade conexa, criminalidade económico-financeira, em especial o crime de branqueamento de capitais, fiscais, contra a segurança social e contra o sistema de saúde.
Bem sei que a opinião pública convive razoavelmente com a corrupção, com pequenos laivos de indignação que não extravasam a conversa de café. Mas, não será, com certeza, elegendo-a como a 10ª prioridade de investigação criminal que tal estado de coisas se alterará.
Em Portugal, a estimativa do custo da corrupção em termos de peso no PIB aproxima-se dos 50 mil milhões de euros, uma fração muito assinalável do nosso PIB e muito acima da média da OCDE. Estudos recentes da OCDE revelam que a generalidade dos portugueses – cerca de 90% - acreditam existir corrupção, lato sensu considerada, no exercício de cargos públicos em Portugal.
Como diria Ágata, a minha preocupação são as prioridades.