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Victor Bandarra

Uma questão de zeros...

Dona Palmira gaba-se de ser barra em aritmética.

Victor Bandarra 22 de Janeiro de 2017 às 00:30

Dona Palmira gaba-se de ser barra em aritmética. Nos seus tempos de escola, não falhava uma conta, feita de cabeça, num ápice.

Hoje, com reforma curta, Palmira segue obrigada a fazer contas de cabeça - às vezes para pagar a renda de casa, outras para acalmar o estômago até ao fim do mês. Ainda assim, não falha a sessão de paleio diário com as amigas, no café da esquina, fazendo render a "bica" escaldada. O sr. Rodrigo, dono do estaminé, já lhes conhece as manhas, as bicadas políticas e as rebuscadas análises económicas de Palmira ao Portugal costa-marcelista e ao Mundo à espera do Trump que aí vem. O grande busílis são os zeros. Palmira e as amigas, a partir dos 100 (euros), têm dificuldade em conceptualizar os milhares, os milhões ou os biliões. Uma confusão!

Nada que não aconteça à maioria dos portugueses, mesmo aos mais instruídos, com problemas crónicos de informação numérica, sobretudo entre os milhões e os mil milhões. A cábula dos zeros parece simples: mil leva 3 zeros, um milhão tem 6 zeros, mil milhões conta com 9 zeros e um bilião estende-se por 12 zeros. O grupo de Palmira é do tempo do escudo e dos contos de réis. Sabiam todas o que valia (o que dava para comprar) uma nota de 100 escudos ou um conto (mil escudos). Mil contos, uma fortuna, era mais difícil de imaginar. Com os euros, Palmira passa por ser a mais lesta nas contas. E todas apostam 2 euros por semana no Euromilhões, por fé ou simples fezada na Sorte, grande ou pequena. Sonham com milhões, mas da boca para fora limitam-se ao "quem me dera o M1lhão! [o jogo adicional]".

Emproada, Palmira insiste em ir citando os milhões que lê no jornal. "Já viram isto?! A dívida portuguesa já vai nos 236 mil milhões de euros..." As amigas fingem-se espantadas e informadas, Rodrigo sorri à socapa. Palmira vira a página e acelera nos zeros. "E os bancos dos outros países já têm nos cofres 24 vírgula 6 mil milhões de euros da nossa dívida..." Ainda que baralhe contas e zeros, a mulher indigna-se face a juros e dívidas, soberanas ou nem por isso. "Não acha que é demais, ó sr. Rodrigo?!"

O homem suspira, soltando o olhar pela casa meio vazia. "Ó Dona Palmira, a partir do segundo zero à direita, já não sei fazer contas..." Malicioso, pró-geringonça, Rodrigo muda de zeros. "Ó Dona Palmira, não se queixe! Finalmente lá lhe subiram a reforma!" Palmira torce o nariz. "Uma miséria, sr. Rodrigo! Uma miséria!" E o homem a dar-lhe. "Mas quanto é que foi aumentada, diga lá!" Palmira aproveita para ripostar na mesma moeda. "Ó sr. Rodrigo! Sou muito má nas contas com zeros à esquerda..."

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